Os Zuavos Pontifícios – Parte 2

“Fuzil sob o braço, terço na mão direita”.

Generale_Kanzler
General Herhmann Kanzler

      Em setembro de 1865 uma notícia veio encher de tristeza todos os soldados do Papa: morrera seu valoroso comandante, o General Christophe de la Moricière.

      Para o substituir, foi nomeado o general alemão Herhmann Kanzler, que durante o cerco de Ancona conseguira romper as linhas inimigas e entrar na cidade. Kanzler substituía igualmente Monsenhor de Mérode no Ministério das Armas. Quando o Prelado belga deixou a importante pasta, muitos espíritos se inquietaram, já que ele representava a idéia da resistência armada às usurpações da Casa de Sabóia. A escolha de um eclesiástico para o seu lugar poderia fazer crer numa mudança de política da Santa Sé; com a designação de um general, Pio IX deixava bem claro quais eram as suas intenções.

      Enquanto isso, acelerava-se a retirada dos territórios pontifícios da divisão francesa de ocupação. Napoleão III, porém, para acalmar a opinião católica, consentira em enviar a Roma um outro corpo de tropa para substituir a Divisão Goyon. Essa nova unidade, que ficou conhecida como Legião Romana ou Legião de Antibes, do nome da cidade em que foi formada, viria prestar valiosos serviços ao Papa nas campanhas futuras. Ela não era, entretanto, suficiente para manter a ordem na Cidade Eterna, onde fermentava a agitação revolucionária das sociedades secretas e dos “clubes”. Foi necessário chamar a Roma os zuavos pontifícios.

      As sociedades secretas, que pensavam aproveitar-se da partida da Divisão Goyon para sublevar a cidade, ao saberem da chegada da tropa comandada por Allet, à qual temiam como o demônio à cruz, desencadearam uma onda de terror contra ela. No dia 16 de janeiro um dos zuavos foi assassinado; dias depois, uma bomba foi lançada à janela do próprio capelão-chefe; ameaçados por cartas anônimas, os estalajadeiros recusavam-se a receber em seus estabelecimentos os oficiais e capelães do batalhão. Como medida de precaução, Allet proibiu que seus homens saíssem desacompanhados à noite, e recomendou-lhes calma e prudência.

      Os zuavos mantêm-se em constante alerta. Mas eles não são apenas soldados: são soldados católicos, que rezam enquanto vigiam. Um deles, o jovem Théodore Wibaux, de 17 anos, conta-nos como eram seus turnos de guarda: “Fuzil sob o braço, terço na mão direita: é assim que conto fazer todos os meus turnos. Recitei o maior número de dezenas que me foi possível” (C. du Coetlosquet, “Théodore Wibaux, Zouave Pontifical et Jésuite” – A. Taffin-Lafort, Lille, 1885, p. 65).

      Entrementes, a 1º de janeiro o batalhão do Tenente-Coronel Allet era elevado a regimento, em virtude do grande afluxo de recrutas, sobretudo holandeses. Estes viriam a constituir o elemento mais numeroso dentre esses soldados do Papa, e é doloroso constatar que descendentes seus são hoje os vanguardeiros do movimento contestatário. Houve numerosas promoções nos quadros: Allet foi promovido a coronel, e o Barão de Charette a tenente-coronel.

Luta abnegada contra a peste.

Epidemia de Colera em 1866
Epidemia de Cólera em 1866

      Em meados do ano de 1866 uma epidemia de cólera, depois de ter feito terríveis estragos no Oriente e nas costas do Adriático, na Sicília e no Reino de Nápoles, surge no Lácio e em Roma. Sua ação devastadora foi favorecida por um calor que atingia 35 graus à sombra.

      Albano, pequena e risonha cidade de seis mil habitantes. foi uma das localidades mais atingidas. Para lá foi deslocado um destacamento de zuavos, a fim de prestar socorros à população. Um espetáculo dantesco aguardava-os à chegada: vinte cadáveres nus, já em putrefação, jaziam abandonados na praça principal, não havendo quem se dispusesse a dar-lhes sepultura. O terror e a morte pairavam sobre a cidade; os pestiferados eram abandonados antes de morrer; todos se afastavam, temendo o contágio; o farmacêutico só atendia à distância, e as autoridades municipais haviam desaparecido.

      Os próprios zuavos, de início, não ousavam tocar nos cadáveres. Conta o jovem soldado Wibaux: “Nosso bravo Tenente de Résimond dá o primeiro exemplo. Ele toma em seus ombros um cadáver e o transporta ao cemitério. Todos o imitam. Nossos camaradas da 6ª Companhia lutaram com abnegação. No campo de batalha, o cheiro da pólvora e o entusiasmo nos esconde o perigo. Mas em presença de um cadáver, ou de um moribundo que se debate, como é necessário ter força e verdadeira coragem!” (Coetlosquet, p. 111).

      Depois de sepultar os corpos abandonados na via pública, saíram os zuavos em busca dos que estavam nas casas. Mas não bastava enterrar os mortos, era necessário evitar novas vítimas, e os abnegados soldados do Papa vêem-se transformados em enfermeiros, cozinheiros, etc. Vários deles, tanto em Albano como depois em Roma mesmo e em outras localidades, pagaram com a vida a sua dedicação.

      Os zuavos pontifícios, contudo, não perdiam de vista o fim para o qual se haviam alistado: a defesa do Papa. Théodore Wibaux, no aniversário da batalha de Castelfidardo, escreve de Albano à família:

      “Nós não somos um exército comum. Sem dúvida, a juventude e a fortuna fazem talvez alguns esquecerem que são os defensores da mais pura e da mais santa das causas. Mas se um acontecimento os coloca subitamente em presença do dever, eles transformam-se em cruzados, e então não há senão um único coração, um único pensamento, uma única paixão. Esse amor por Pio IX e pela Santa Igreja faz desculpar muitas fraquezas, inspira um ardente desejo de combater e de morrer. Tal desprezo da morte não é natural. Todos esperam o dia do sacrifício como um dia de festa” (op. cit., p. 124).

      Logo chegaria o momento tão desejado da batalha. Os zuavos receberam ordem de deixar os aventais brancos de enfermeiros e tomar as carabinas, para fazer frente à invasão garibaldina que já se prenunciava.

As hordas garibaldinas, “tão covardes quanto celeradas”.

Batalha contra Garibaldi
Batalha contra Garibaldi

      O confronto direto dos zuavos com as hordas revolucionárias de Giuseppe Garibaldi e com as tropas piemontesas teve início sobretudo a partir da famosa Convenção de Setembro, pela qual em 1864 Napoleão III abriu ao Rei Vitório Emanuel o caminho para suas sacrílegas pretensões sobre os Estados da Igreja.

      Em virtude da Convenção de Setembro, o Piemonte comprometia-se a defender “o território atual do Santo Padre” contra qualquer ataque vindo do exterior, o que o deixava à vontade para fomentar a sedição no interior desses mesmos territórios, como efetivamente já o vinha fazendo, em colaboração com as sociedades secretas e os “clubes”.

      A própria promessa de impedir a agressão externa não fora feita para ser cumprida. As hordas garibaldinas entravam impunemente nos Estados da Igreja, atacavam cidades e aldeias, pilhavam os cofres públicos, maltratavam os habitantes e profanavam os santuários. Quando eram repelidas pelos soldados de Pio IX, punham-se a salvo atravessando novamente a fronteira e saindo do Lácio, onde os pontifícios não podiam ir ao seu encalço, sob pena de entrar em choque com as tropas piemontesas, as quais teriam assim pretexto para atacar os territórios do Papa. Essa tática tinha ainda a vantagem de atrair as tropas de Sua Santidade para as fronteiras, deixando Roma à mercê dos revolucionários.

      A 29 de setembro de 1867, uma notícia agitava a capital da Cristandade: os irregulares de Giuseppe Garibaldi haviam invadido em massa o Lácio. O General Kanzler, Pró-Ministro da Guerra pontifício, que previra essa invasão com um mês de antecedência e distribuíra seu pequeno exército por todo o território latino, enfrentou o inimigo. O principal cenário das batalhas foi a província de Viterbo: Acquapendente, Valentano, Bagnorea, Subiaco, Monte-Libretti, Montefiascone…

      Enquanto se travavam os mais encarniçados combates entre as tropas pontifícias e os “camisas-vermelhas”, a Cidade Eterna achava-se mergulhada na calma, que é freqüentemente o prenúncio de grandes tempestades. Com efeito, todos sabiam que uma revolução estava prestes a eclodir. “Para o estrangeiro, Roma não mostra nenhum sinal de agitação. Mas quando cai a noite, começam os golpes na sombra. A cidade torna-se silenciosa como um túmulo; às seis horas pensaríeis ser meia-noite” — escreve o zuavo Wibaux (Coetlosquet, p. 131). Um outro zuavo, o Visconde Oscar de Poli, assinala que “durante todo o dia vêem-se circular pelo Corso homens de aspecto sinistro, mal vestidos e desconhecidos em Roma. Eles aguardam evidentemente um sinal” (Cerbelaud-Salagnac, p. 140).

      O sinal veio às dezenove horas do dia 22 de outubro: no instante em que uma bomba explodia na Praça Colonna, bandos de “feroci“, armados até os dentes, lançaram-se simultaneamente sobre o Capitólio, a prisão de San Michele, os Carceri Nuovi, a Porta de São Paulo e o Quartel de São Calixto, ocupado pelos zuavos. Travaram-se encarniçados combates, e os revolucionários foram repelidos. Subitamente, uma explosão formidável abalou toda a cidade. Ia pelos ares o Palácio Serristori, que abrigava o estado-maior pontifício e três companhias de zuavos. Com a cumplicidade de um proprietário vizinho, os revolucionários haviam cavado um túnel até os alicerces do edifício. Do meio das trevas, da fumaça e da poeira, erguiam-se os gritos de dor dos feridos; os habitantes da região corriam de um lado para outro, sem ousar aproximar-se, com medo de nova explosão.

      Escreve o Barão de Mévius: “Entretanto, os zuavos sobreviventes não haviam perdido o sangue-frio no meio da catástrofe. Comandados pelo intrépido Capitão-Ajudante de Bellevue, acendem tochas, tomam suas armas e saem dos escombros da caserna no momento em que um bando de garibaldinos — ou antes, uma horda de assassinos — se precipitava sobre o quartel, para acabar sua obra infame pelo massacre dos soldados que haviam escapado ao desastre. Com grande espanto seu, foram recebidos a tiros de fuzil; e, tão covardes quanto celerados, fugiram às certeiras descargas” (Cerbelaud-Salagnac, p. 142).

      Ao mesmo tempo correm pela cidade rumores de que vários outros quartéis e edifícios públicos estão minados, mas a polícia consegue descobrir os responsáveis antes que tenham tempo de atear fogo à mecha assassina. O resto da noite transcorre em meio a patrulhas e batidas policiais.

      “Um combate em pleno dia seria uma festa — escreve à família o jovem zuavo Théodore Wibaux. — Ainda que fossem dez contra um, nós iríamos cantando ao seu encontro. Mas dentro de uma grande cidade, no meio das trevas e da traição, sente-se um aperto no coração, apesar de todo o devotamento” (Coetlosquet, p. 131).

      Os dias seguintes foram de expectativa, pois circulavam boatos de que Garibaldi havia burlado a vigilância dos piemonteses, que o mantinham confinado — já sabemos com que zelo… — e marchava sobre Roma à testa de grossa coluna. Falava-se, ao mesmo tempo, na chegada de um novo corpo expedicionário francês, solicitado havia muito pela Santa Sé, mas cujo embarque o gabinete das Tulherias vinha retardando. Ante a iminência do ataque e a incerteza do socorro da França, o General Kanzler ordenou que suas tropas se concentrassem em Roma.

      A noite de 27 para 28 de outubro foi de grande tensão. Aguardava-se o ataque geral de um momento para outro. As tropas do Papa permaneciam em alerta. Os zuavos achavam-se formados na Praça de São Pedro. “Reconheci na Praça o Rei de Nápoles — escreve o capelão deles, Cônego Daniel. — Ele teve a bondade de se dirigir a mim. Seu irmão está com o general, na Ponte Salario, e as princesas no Vaticano. O Rei está conosco, à espera. Que espetáculo era ver todas essas nobres desventuras reunidas, aguardando juntas a sorte daquela noite…” (Cerbelaud-Salagnac, p. 149).

      “Enquanto vos escrevo — lê-se em outra carta de Théodore Wibaux à família — posso ser interrompido pelo brado de alerta e largar minha pena para tomar a carabina. Dentro de uma hora, ou menos que isso, pode-se travar o combate da verdade contra a mentira, do mais santo dos direitos contra a injustiça. Meu coração está calmo e cheio de imensa confiança na misericórdia divina. Sinto que meu braço é demasiado fraco, que deixo atrás de mim tantas afeições, que sou jovem para morrer. Experimento tudo isso, sinto minha indignidade para comparecer diante de Deus, mas espero cegamente. Meu bom Anjo dirigirá e fortalecerá meus golpes; meu uniforme, meus sofrimentos, meu sangue livremente derramado, purificarão minha alma de suas manchas. Sim, meu Deus, Vós prometestes o Céu àqueles que sofrem por amor à justiça. Eis-me aqui, pobre filho vosso! Eu uno, tanto quanto posso, meu sangue ao vosso, minha cruz à vossa: aceitai-me” (Coetlosquet, p. 134).

      O ataque não se produziu. No dia 28, às cinco horas da tarde, uma esquadra francesa ancorava em Civitavecchia; na manhã seguinte o corpo expedicionário do General Failly começava a desembarcar.

En avant! Marchons! Zouaves du Pape, à l’avant-garde“.

Zuavos na guerra
Zuavos na guerra

      Garibaldi, entretanto, não havia renunciado à luta. Ele concentrava seus homens não longe de Roma, na esperança de poder investir sobre a Urbe antes que os soldados franceses chegassem de Civitavecchia. Ao mesmo tempo, tropas do Piemonte atravessavam a fronteira do lado de Viterbo e confraternizavam com os revolucionários. Vitório Emanuel explicou à França e à Europa que seus soldados haviam entrado nos Estados Pontifícios para manter a ordem. O que não convenceu a ninguém. Aliás, era sabido que nas próprias hostes garibaldinas havia numerosos oficiais e soldados do Piemonte, travestidos de “camicie rosse“. Tecnicamente eram considerados desertores; no entanto continuavam a ser promovidos nos quadros do exército regular.

      A ocasião parecia muito oportuna para um contra-ataque dos pontifícios, e o General Kanzler procurou obter o apoio francês, indispensável para a empresa. O General Pailly objetou que tinha ordem de não entrar em choque com os soldados do Piemonte, os quais sabia estarem ao lado dos garibaldinos. Acrescentou que apenas uma de suas brigadas estava apta para o combate, e ele não queria meter-se em uma aventura, já que Garibaldi tinha mais de dez mil homens. Por fim, após longa discussão, acabou cedendo.

      No dia 3 de novembro as tropas de Pio IX punham-se em movimento sob uma chuva torrencial, seguidas pela brigada francesa do General Polhes. Os zuavos pontifícios marchavam cantando o seu refrão: “En avant! Marchons! Zouaves du Pape, à l’avant-garde! Le monde nous regarde. En avant, Bataillon!

      Ao meio-dia dava-se o primeiro encontro com o inimigo, fortemente entrincheirado nas colinas próximas a Mentana. Tinha início uma das mais gloriosas batalhas travadas pelas tropas pontifícias, que constituiu uma verdadeira revanche à derrota de Castelfidardo. Foram muitos os lances heróicos. Impossível tudo contar, impossível tudo calar. Vejamos apenas alguns episódios dessa luta que fez de cada soldado do Papa um herói de canção de gesta; e de muitos deles, mártires.

      Energicamente atacados à baioneta, o garibaldinos recuaram, perseguidos pelos zuavos que formavam a vanguarda pontifícia. Menotti Garibaldi, filho do condottiere, veio em socorro deste com dois nutridos batalhões, que encontraram pela frente apenas a companhia do Capitão Barão de Thomalé. Entrincheirados no alto de uma colina, os garibaldinos fizeram fogo cerrado. Advertido, Charette enviou duas companhias de zuavos em auxílio de Thomalé. Estas hesitaram em atacar corpo-a-corpo o inimigo, que estava bem abrigado, e se puseram a atirar à distância.

      Conta à família o zuavo Théodore Wibaux:

      “A troca de balas durava já algum tempo, mas o exercício de tiro-ao-alvo agradava pouco ao temperamento borbulhante do Tenente-Coronel de Charette. Pondo-se no meio das balas, disse: ‘Meus amigos, desalojai-os à baioneta!’ E impelindo seu cavalo em direção aos garibaldinos, bradou: ‘Vamos, senão irei só!’ Ele bem sabia que ocorreria o contrário. Cada um se desembaraçou da mochila, para correr segundo a inspiração de sua própria coragem. As companhias se misturaram umas às outras e se dispersaram em todas as direções.

      “Por um instante o ardor dos zuavos foi contido diante da Vinha Santucci, um parreiral protegido por um muro baixo, onde se encontrava a granja que servia de trincheira aos garibaldinos. A casa foi logo tomada de assalto. Evacuada a elevação, a tropa pontifícia ali instalou algumas peças de artilharia. Retomamos nossa corrida desordenada atrás dos garibaldinos; cada vinha, cada casa era tomada peça por peça” (Coetlosquet, p. 141).

      Acrescenta o Barão de Mévius: “A alguns passos dali, o Coronel de Charette caiu com seu cavalo atravessado por três balas. Seus soldados julgaram-no atingido e correram para o levantar, quando, para grande alegria de todos, ele se ergueu tranqüilamente e continuou a dar as ordens com inalterável sangue-frio” (Cerbelaud-Salagnac, p. 163).

      O valoroso capelão Cônego Daniel acompanhava os soldados no mais aceso da refrega. Lê-se em seu diário:

      “Um forte tiroteio se trava; eu avanço, pois há feridos: o Tenente Jacquemont, Yves de Quatre-Barbes, Pierre Audouin, Leton, um holandês que grita “Viva Pio IX!”, um outro que não conheço e que está bem mal, e a quem dou também a Extrema-Unção. A continuação desse caminho está a descoberto, é bem perigosa. Agacho-me um instante, depois subo o barranco; aqui não é melhor que lá. O Capitão de Fumei me diz: ‘Sr. Capelão, o senhor está muito mal aí!’” (Cerbelaud-Salagnac, p. 164). E o Cônego, atordoado pelas balas, continua a correr de um lado para outro, à procura dos feridos, e os confessa, absolve, dá-lhes a Extrema-Unção. Alguns “camisas-vermelhas” aceitam o socorro espiritual na hora suprema. Outros, não: “Morriam como cães, recusando qualquer auxílio, exclamando em altas vozes que queriam ir para o inferno” — conta Wibaux (Coetlosquet, p. 145).

      Por volta das três e meia da tarde, Menotti Garibaldi, que tinha ainda numerosa tropa descansada, lança contra os pontifícios duas colunas de três mil homens cada uma. Não dispondo mais de reservas, Kanzler apela para os franceses. O General Polhes, já impaciente por entrar no combate, movimenta sua tropa, a qual se atira sobre o inimigo com grande élan, contagiada pelo entusiasmo dos soldados do Papa. Juntos, franceses e pontifícios contra-atacam, põem os revolucionários em fuga e os perseguem até Mentana — onde os camicie rosse tinham-se fortemente entrincheirado — e tomam a cidade. Giuseppe Garibaldi, que havia jurado “Roma ou a morte!”, tendo perdido a primeira, tratou prudentemente de evitar a segunda. Desanimados pela deserção do chefe, seus homens acabam por debandar e ganham a fronteira. Os menos felizes foram mortos ou feitos prisioneiros.

      O General Kanzler foi recebido em Roma com todas as honras, e Pio IX o acolheu declamando os primeiros versos da “Jerusalém Libertada” de Torquato Tasso: “Canto l’armi gloriose e ‘l Capitano / Che ‘l gran sepolcro liberó di Cristo” (Gian Ludovico Masetti Zannini, “Il bichiere di Papa Mastai” – Editrice Queriniana, Brescia, 1957, p. 63).

      A batalha de Mentana não só constituiu uma importante vitória militar, mas representou acima de tudo um triunfo moral para a causa do Papa, como o exprime a carta que o Conde de Chambord — o pretendente legitimista ao trono da França — escreveu a seu sobrinho, o Barão Athanase de Charette:

      “No momento, meu caro Charette, em que vós, vossos irmãos e um tão grande número de nossos amigos haveis combatido e vencido pela mais nobre das causas, sinto a necessidade de dizer-vos que eu estava junto de vós pelo coração e pelo pensamento, já que, com grande pesar meu, não podia aí estar pessoalmente. Graças a esse admirável devotamento e a essa brilhante coragem, a revolução, pela primeira vez depois de tantos anos, foi obrigada a recuar, e por ora a soberania do Papa está salva. Glória a vós e vossos companheiros de armas! Os que sucumbiram nessa luta heróica não devem ser lamentados; eles recebem agora no Céu a recompensa de seu generoso sacrifício; mas nós os choramos, admirando-os” (Cerbelaud-Salagnac, p. 177).

      A vitória de Mentana foi, antes de tudo, uma vitória sobre a Revolução, e trouxe para a Santa Sé um período de relativa calma, que permitiu a preparação e a realização do I Concílio do Vaticano. A augusta assembléia iria infligir uma nova e gravíssima derrota à Revolução, ao definir o dogma da infalibilidade pessoal do Papa.

Consuma-se o grande sacrilégio.

Pio IX
Pio IX

      A 18 de julho de 1870 o dogma da infalibilidade pontifícia era solenemente proclamado em Roma. No mesmo dia, e talvez à mesma hora, a França declarava guerra à Prússia. Alguns dias depois, em Viena, estava prestes a celebrar-se uma aliança militar franco-austro-italiana, quando a Itália exigiu como condição sine qua non a evacuação de Civitavecchia pela guarnição francesa. Em outras palavras, o direito de anexar Roma. Napoleão III não podia aceder a isso sem se tornar réu de traição ao Papa. O seu Ministro, Duque de Gramont, declarou: “A França não pode defender sua honra sobre o Reno e sacrificá-la no Tibre”. Belas palavras, que o governo francês desmentiria dois dias depois, alegando necessitar de todas as suas tropas, e ordenando a retirada dos dois mil soldados que tinha conservado em Civitavecchia após a batalha de Mentana.

      Era o sinal esperado por Vitório Emanuel. Imediatamente as tropas italianas começaram a transpor todas as fronteiras do Lácio. O General Kanzler ordenou aos comandantes das guarnições espalhadas pelas diversas províncias latinas que oferecessem ao inimigo uma resistência apenas simbólica e refluíssem para Roma.

      Quanto a Napoleão III, a Providência encarregava-Se de punir-lhe a traição: após três fulgurantes vitórias em Wissembourg, Froeschviller e Forbach, os prussianos invadiam a Alsácia e parte da Lorena, punham sítio a Strasburgo e bloqueavam um exército francês inteiro em Metz; logo o imperador era feito prisioneiro, e a república proclamada na França. “Muitos zuavos, vendo a França engajada numa guerra terrível, queriam voltar ao seu país para combater; procurou-se retê-los. O Cura d’Ars dizia que entre todos os soldados da França, os que melhor a serviam eram os soldados de Roma que velavam pela defesa da Igreja” — escreve o capelão dos zuavos (Cerbelaud-Salagnac, p. 190). Não só a maior parte destes permaneceu a serviço do Vigário de Cristo, como também outros, que se encontravam de licença, voltaram à Cidade Eterna.

      Procurando ainda salvar a face, o Rei da Itália enviou ao Papa um emissário pessoal, o Conde Gustavo Ponza di San Martino, com uma carta. Nela, declarando-se, “por disposição da Divina Providência e vontade da nação, defensor e guardião de todos os italianos”, Vitório Emanuel afirmava “achar-se no dever de assumir a responsabilidade pela manutenção da ordem em toda a Península e de velar pela segurança da Santa Sé”. E pedia a Pio IX que permitisse a entrada pacífica de suas tropas em Roma. Em outras palavras, que se deixasse despojar, sem resistência, do que lhe restava de soberania.

      Um contemporâneo, Monsenhor di Bisogno, assim se refere à rápida entrevista do fidalgo sub-alpino com Pio IX, no dia 10 de setembro: “Recordo que eu mesmo introduzi junto ao Papa o Conde di San Martino, o qual entrou com toda a desenvoltura; mas saiu de tal modo confundido que, ao invés de dirigir-se à porta de saída, caminhou em direção à janela” (Masetti Zannini, p. 89).

      No dia 14 o General Cadorna, comandante supremo das tropas piemontesas, enviava a Kanzler uma nota na qual o intimava a permitir a ocupação “pacífica” de Roma. O Pró-Ministro pontifício da Guerra respondeu ao emissário: “Diga ao seu general que nós não os fomos procurar, e que não temos necessidade dos senhores. Se nos atacarem, nós nos defenderemos com todos os meios de que dispomos, como nos ordenam o dever e a honra. Não tenho mais nada a acrescentar” (Cerbelaud-Salagnac, p. 199). Era necessária não pequena coragem para falar nesse tom, dispondo de apenas onze mil homens contra setenta mil!

      Pio IX conservava sua habitual — e sobrenatural — tranqüilidade de alma, continuando a tratar dos assuntos eclesiásticos como se ao seu redor não se estivesse preparando a mais encarniçada das lutas. A 19 de setembro, vigésimo quarto aniversário dos fatos de La Sallete, ele assina o decreto reconhecendo as aparições da Virgem das Lágrimas. Às cinco horas da tarde dirige-se à Scala Santa e sobe-a de joelhos, suplicando a Deus que, pelos méritos infinitos do preciosíssimo Sangue de Jesus Cristo, derramado sobre aqueles degraus, tivesse piedade da sua Igreja.

      Às cinco horas da manhã seguinte, um rumor surdo como o de um terremoto abalou a Cidade Eterna. Começara o bombardeio. Ao mesmo tempo, as tropas da infantaria inimiga preparavam-se para o assalto. Tentaram-no várias vezes, em diversos pontos, mas foram repelidas com energia. A divisão do General Cosenz atacava pelo nordeste, a do General Mazé de la Roche pelo leste, enquanto a do General Ferrero lançava-se sobre os Três Arcos.

      Às nove horas e meia as baterias italianas estavam a apenas trezentos metros dos muros de Roma. Sobre o Trastevere os canhões do terrível Nino Bixio — que prometera lançar todos os cardeais no Tibre — despejaram mais de quatro mil obuses, atingindo dezenas de casas e dois hospitais; os projéteis chegaram até junto do Vaticano, onde se encontrava o Papa.

      O ataque principal era desfechado ao norte e a leste, onde Cadorna dirigia pessoalmente três divisões. Suas baterias, instaladas na Villa Borghese, assestavam rudes golpes às muralhas, que às nove e um quarto desmoronaram numa extensão de trinta metros, entre a Porta Pia e a Porta Salariana. Imediatamente, em duas colunas, a 12ª Divisão piemontesa marchou contra a Porta Pia, e a 11ª, protegida pela artilharia, contra a Salariana, aos gritos de “Roma, capitale!“. Os zuavos responderam com o brado de “Viva Pio IX!”, e detiveram o avanço inimigo com o fogo mortífero de seus fuzis.

      Durante uma hora os zuavos mantiveram o fogo, cantando o hino a Pio IX. A brecha media agora quarenta metros. O General Mazé de la Roche, desejando transpô-la a todo o custo, lançou sobre ela a tropa de reserva. O Major de Troussures deu ordem aos seus zuavos de receber o adversário à baioneta. Nesse momento chega um dragão romano a cavalo e grita ao Major: “Levantar a bandeira branca, por ordem do General Zappi!” Troussures responde: “Diga ao General que não recebo uma ordem dessas, a não ser por escrito ou trazida por um oficial!” E lançou-se também ele no furioso corpo-a-corpo que se travava na brecha. Dez minutos depois chegava ao local o Tenente de Kerckove com a ordem de cessar o combate.

      Enquanto os zuavos recuavam e agitavam um pano branco, duas companhias de bersaglieri marchavam sobre eles a passo de carga, vociferando injúrias e atirando. A resposta que tiveram foi pronta. Quinze zuavos caíram mortos ou feridos, mas o número de inimigos que ali tombou foi três vezes maior. Surgiu então o Capitão de France, do estado-maior pontifício, com uma bandeira branca, e dirigiu-se a Troussures: “Meu Comandante, por favor, mande tocar o cessar-fogo”. As notas breves e estridentes desse toque fizeram-se logo ouvir.

      Em todas as frentes, mais ou menos ao mesmo tempo, chegava aos soldados do Papa a ordem de suspender o combate, que já durava cinco horas e meia. Vendo que não tinha condições de enfrentar o assédio, Pio IX havia determinado que a resistência se prolongasse apenas o suficiente para deixar patente aos olhos do mundo que o Vigário de Cristo não cedia senão à violência.

Capitulação honrosa, insolência da soldadesca vitoriosa.

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Zuavo escreve o nome do seu batalhão com o próprio sangue

      Enquanto os parlamentares italianos discutiam com o General Kanzler as condições da capitulação, os soldados de ambos os lados deviam manter-se nas respectivas posições. Mas a soldadesca italiana, aproveitando-se da superioridade numérica de vencedores — “vae victis!” — passou a agredir e injuriar os pontifícios, arrancando-lhes do peito com fúria as medalhas gloriosas de Castelfidardo e Mentana.

      A capitulação previa que Roma inteira, à exceção da cidade leonina, onde se encontra o Vaticano, seria entregue às tropas de Vitório Emanuel. A guarnição deveria sair com suas armas e bagagens, e receberia as honras de guerra. Em seguida, os soldados seriam desarmados, mas os oficiais conservariam suas espadas e seus cavalos. As tropas estrangeiras seriam imediatamente licenciadas e conduzidas até as fronteiras de seus países, sob custódia do governo italiano. os soldados naturais dos Estados Pontifícios ou de outras regiões da Itália seriam considerados prisioneiros de guerra.

      Haviam perecido em combate naquela jornada dezesseis soldados do Papa, dos quais dez zuavos, e ficaram feridos cinqüenta e oito, dos quais vinte e sete zuavos. As perdas do invasor subiram a mil e oitocentos homens, entre mortos e feridos.

A noite foi terrível para a Cidade ocupada.

Encontro de Garibaldi (esquerda) com o rei Vitório Emanuel (direita)
Encontro de Garibaldi (esquerda) com o rei Vitório Emanuel (direita)

      A noite de 20 de setembro foi terrível para a Cidade pontifícia, entregue a todos os desmandos dos revolucionários. “Cenas horríveis passam-se por toda parte; verdadeiras bacanais, cenas hediondas; as mulheres dançam com os bersaglieri, que dão urros de fazer tremer” — escreve Monsenhor Daniel, capelão-chefe do Regimento dos Zuavos (Cerbelaud-Salagnac, p. 219).

      O verdadeiro povo romano, porém, não manifestava senão tristeza pela ocupação. Refere-nos o Conde Masetti Zannini as recordações de um velho amigo de sua família, o Conde Antonio Conestabile della Staffa. Este, criança ainda, sem avaliar a importância do que se passava em seu redor, saíra com a governanta a passear pelas imediações da Porta Pia. Caminhando pelo acampamento das tropas pontifícias, vira pela primeira vez os bersaglieri, que do outro lado preparavam-se para derrubar a porta ou nela abrir uma brecha. No dia seguinte, da janela de seu palácio no Corso, vendo-os correr no seu passo característico, ao som das fanfarras, pôs-se a aplaudir com entusiasmo infantil. Voltando-se para trás, viu que seus pais, a um canto, choravam. Tal era o sentimento de “fidelidade, de afeto, que ligava a aristocracia da cidade e o povo do campo a Pio IX” — comenta o autor (p. 11).

      “Mas o governo de Florença [a capital provisória de Vitório Emanuel], que sabia que Roma permaneceria fria, e que sentia a necessidade de fazer barulho, tinha pronto já o remédio para o mal. Na noite de 20 de setembro os trens trouxeram para Roma uma tal masnada di canagliume, que a cidade na quarta-feira já não era a mesma” — escrevia à família naqueles dias o futuro polemista Giuseppe Sacchetti, então jovem voluntário pontifício (Gabriele de Rosa, “Giuseppe Sacchetti e l’opera dei Congresse” – Editrice Studium, Roma, 1957, p. 45).

      Aos milhares de “dimostranti“, trazidos de fora pelo governo piemontês para representarem o entusiasmo popular, uniram-se criminosos de toda espécie, libertados das prisões. Esses bandidos de vulto sinistro, embriagados, armaram-se de fuzis tomados aos pontifícios, de chuços, punhais, paus e pedras, e começaram a percorrer as ruas da Cidade Eterna, semeando o terror à sua passagem, com imprecações, blasfêmias, assassinatos, assaltos a residências, especialmente àquelas em que viviam as famílias dos zuavos.

      Os piemonteses, longe de reprimir tais excessos, antes parecia que os estimulavam. Quando algumas pessoas foram pedir a Cadorna que pusesse um paradeiro àquilo, ele respondeu: “Lasciate il popolo sfogarsi!” — deixe o povo desabafar (A. Pougeois, p. 535).

“Viva Pio IX, nosso Rei! Viva Pio IX, Pontífice e Rei!”

      Às dez horas da manhã seguinte as fanfarras davam o toque de reunir na Praça de São Pedro, para a derradeira parada dos exércitos pontifícios.

      Ao passarem as diversas unidades sob a janela do Papa, para receber sua última bênção, o comandante de cada uma delas erguia a espada e bradava: “Viva Pio IX! Viva o nosso Rei!” E os soldados respondiam: “Viva Pio IX, Pontífice e Rei”.

      Dando a volta à praça, as tropas pontifícias saíram pelo Borgho Santo Spirito e se dirigiram ao Trastevere, onde receberam as honras militares por parte dos piemonteses. Findo o desfile, depuseram as armas. A partir daquele momento o Papa encerrou-se no Vaticano, considerando-se prisioneiro.

      No dia 22, os soldados estrangeiros foram levados para Civitavecchia e submetidos à triagem por nacionalidades. Os franceses, graças à intervenção do comandante da fragata “Orénoque”, ali fundeada, foram conduzidos para bordo daquele vaso de guerra.

      Realizou-se no convés da “Orénoque” uma tocante cerimônia, assim descrita pelo Capitão zuavo Jacquemont:

      “No dia 25 de setembro, que era domingo, após a Missa celebrada pelo capelão na ponte da fragata, todos se reuniram em torno de seu coronel. O Capitão de Fumel desdobrou a bandeira do Regimento, que havia conseguido trazer sob a túnica, enrolada à cintura. Depois de saudar pela última vez o glorioso pendão perfurado pelas balas de Mentana, os zuavos o repartiram entre si. Cada um queria ter um fragmento dele e guardar sobre o coração essa relíquia” (Cerbelaud-Salagnac, p. 223).

      Como a fragata estava sobrecarregada e sem condições de fazer-se ao mar, seu comandante mandou pedir auxílio a um navio das Messageries Maritimes, que se encontrava próximo e se dirigia para Marselha. Alguns dias depois o “Ilissus” aportava em Civitavecchia, e os zuavos e os homens da Legião de Antibes — remanescentes do corpo expedicionário enviado por Napoleão III — embarcavam nele.

      À noite o navio francês levantava âncora e se afastava lentamente. Da ponte, reunidos em torno de Charette, os zuavos contemplavam pela última vez o litoral dos Estados Pontifícios, a cuja defesa haviam consagrado os melhores anos de suas vidas, e onde haviam tombado tantos de seus companheiros de armas.

      Os zuavos franceses, conduzidos pelo bravo e generoso Barão Athanase de Charette de la Contrie, não mais podendo lutar pelo Papa, iriam derramar seu sangue pela filha primogênita da Igreja. Em vinte combates da guerra franco-prussiana, escreveram eles outras tantas páginas dessa gesta admirável, que como as Cruzadas mereceria o título de “Gesta Dei per francos“.

Também o Brasil teve a glória de dar um zuavo ao Papa.

Zuavo brasileiro
Zuavo brasileiro

      Em dez anos de existência em Roma (1860-1870), passaram pelo Regimento dos Zuavos Pontifícios 3181 holandeses, 2964 franceses, 1634 belgas, 744 italianos, 498 canadenses, 249 alemães, 184 irlandeses, 125 ingleses, 94 espanhóis, 45 suíços, 33 poloneses, 28 austro-húngaros, 25 escoceses, 20 luxemburgueses, 19 portugueses, 17 norte-americanos, 14 antilhanos, 9 sul-americanos, 5 russos e 1 chinês.

      Não poderíamos encerrar estas notas sem uma referência ao único zuavo brasileiro de que temos notícia: João Antônio Dantas da Gama. Esse filho de ilustre família do Império não hesitou um instante em deixar a vida despreocupada de estudante em Paris, para alistar-se como soldado do Papa. Infelizmente, poucos são os dados sobre sua vida militar. Uma velha fotografia no-lo apresenta em uniforme de oficial dos zuavos pontifícios.

      Seus escritos deixam entrever-lhe a alma de cruzado. Ele escrevia em janeiro de 1869: “Senhor, Deus meu, meu Criador e meu Pai! Vós me pusestes no coração o dever de sofrer e de morrer em defesa da liberdade da Igreja. Sede mil vezes glorificado!” (César Salgado, “Um brasileiro, zuavo de Pio IX e soldado de Santo Inácio” – in “ASIA”, junho de 1948, p. 32).

      Com a queda de Roma, João Antônio Dantas da Gama foi feito prisioneiro de guerra e esteve encarcerado em Spoleto e Livorno. Posto em liberdade, ingressou em outra milícia da Igreja, a Companhia de Jesus, cujo hábito recebeu em 4 de novembro de 1870, em Tronchiennes, na Bélgica. Nessa mesma cidade fez seus estudos de Filosofia e Teologia, que concluiu em Louvain e Tornai. Foi ordenado sacerdote em 1880 e lecionou em Antuérpia e Tronchiennes. Faleceu em 1883, aos 37 anos.

      Em recompensa pelos seus serviços e devotamento à Igreja e ao Pontífice Romano, recebeu de Pio IX um fragmento do Santo Lenho. Essa preciosa relíquia passou depois a familiares seus, residentes em Pindamonhangaba, e foi mais tarde doada à matriz daquela cidade paulista, onde até hoje é venerada.

(Gustavo Antonio Solimeo, in “Catolicismo”, nº 239, 240)

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