De todo o mundo eles acorreram para lutar pelo Papa.
“Sinto a necessidade, o desejo de realizar por Ti, Jesus, todas as obras mais heróicas. Sinto em minha alma a coragem de um cruzado, de um zuavo pontifício. Quisera morrer num campo de batalha, em defesa da Igreja” (Santa Teresinha, “Manuscritos Autobiográficos”).
Esse sublime ideal, que abrasou a grande alma de Santa Teresinha do Menino Jesus, trinta anos antes havia empolgado a juventude católica de todo o mundo. O desejo de realizar por Jesus Cristo as obras mais heróicas, de morrer no campo de batalha em defesa da Igreja, levou inúmeros jovens a atender ao apelo de Pio IX contra a revolução que decidira espoliá-lo de seus Estados. Dentre esses novos cruzados, que com seu sangue escreveram uma das páginas mais belas da história da Igreja nos tempos modernos, tornou-se legendária a figura do zuavo pontifício, como a encarnação da honra e da fidelidade, a personificação da bravura e do desprendimento, o símbolo da intrepidez e da coragem.
O Vigário de Cristo, Pontífice e Rei.
Antes de iniciar a nossa narrativa sobre os atos de bravura desses soldados de Cristo, vejamos rapidamente a origem, a natureza e a constituição dos Estados Pontifícios, em cuja defesa eles se ergueram.
A necessidade de gozarem os Papas de soberania temporal foi exposta por Pio IX em várias ocasiões. Na alocução à Nobreza Romana, em 1º de janeiro de 1873, ele afirma:
“Para que os Papas sejam livres, é preciso que não dependam de ninguém sobre a terra, isto é, que sejam soberanos e que gozem de uma soberania real, e não fictícia como aquela que pretendem conceder-Nos e está à mercê de um rei estrangeiro.
“É certo que, se em lugar do poder temporal os sucessores de São Pedro tivessem recebido o mesmo poder que o Príncipe dos Apóstolos — de que temos uma esplêndida prova na morte de Ananias e Safira — teriam um poder tão superior, que poderiam prescindir do poder temporal para governar livremente a Igreja de Deus. Mas como Deus dispôs de outra forma, e não gozamos do poder sobrenatural de São Pedro, é absolutamente necessário que os Soberanos Pontífices não sejam submissos a nenhuma autoridade, para poderem livremente dirigir a Igreja de Jesus Cristo. E portanto é necessário que possuam o poder temporal” (J. M. Villefranche, “Pio IX” — Panorama, São Paulo, 1948, p. 373).
No século IV, ao transladar a sede do governo imperial para Constantinopla, deixando Roma praticamente entregue ao Papa, Constantino estava, talvez sem o saber, atendendo a um desígnio da Providência.
Mais tarde, Pepino o Breve doou à Igreja em 756 o Exarcado de Ravena, de onde expulsara os lombardos. Carlos Magno acrescentou a esses domínios Perugia e Spoleto. No século XII o Imperador Henrique III cedeu ao Sumo Pontífice o Ducado de Benevento. No mesmo século, a piedosa Condessa Matilde da Toscana, um dos esteios de São Gregório VII na luta pela independência do Papado, legou à Santa Sé os territórios que passaram a ser conhecidos como Patrimônio de São Pedro. O Príncipe Luís de Gonzaga reuniu a Marca de Ancona aos Estados da Igreja, em 1532. Os Ducados de Urbino e Castro e o Condado de Romiglione foram incorporados aos territórios do Papa no século XVII (cf. A. Pougeois, “Histoire de Pie IX, son Pontificat et son siècle” – J. Pougeois-Libraire-Editeur, Paris, 1884, vol. 5, p. 92).
Essa a origem do poder temporal do Pontífice Romano. Se tal poder não é de direito divino, é incontestável que não se teria estabelecido sem uma série de circunstâncias favoráveis, nas quais não se pode deixar de ver a mão da Providência. Durante séculos os Papas souberam manter a integridade do patrimônio recebido de seus antecessores, e a isso se obrigavam por juramento, ao cingirem a tiara.
A Revolução não podia — como não o podem seus filhos “proféticos” e “desalienados” de hoje — suportar a soberania temporal do Chefe da Igreja. A França revolucionária sob o Diretório, e mais tarde sob Napoleão, despojou brutalmente o Pontífice desse poder. O usurpador corso teve o despudor de declarar que o fazia em atenção aos interesses da Religião. Assim reza o decreto imperial de 2 de abril de 1808, que arrancava ao Papa as províncias de Urbino, Ancona, Macerata e Camerino: “Atendendo a que o atual Soberano de Roma tem constantemente recusado fazer guerra aos ingleses, e que a dotação feita por Carlos Magno, Nosso ilustre predecessor [!!], dos Países que formam o Estado do Papa, fora feita em proveito da Cristandade, e não dos inimigos de nossa santa Religião…” (Villefranche, p. 66).
“Tudo isto Te darei, se prostrado me adorares”.
Depois que o Congresso de Viena devolveu ao Papa os seus territórios, os revolucionários não cessaram de ali fomentar a rebelião. Gregório XVI (1830-1846) viu-se forçado a pedir o auxílio da França e da Áustria para manter a ordem na Romanha e nas Marcas.
Desde 1848 os territórios pontifícios eram protegidos por tropas francesas, apesar de Napoleão III, antigo carbonário, ser ardoroso partidário do “Risorgimento” e favorecer, o quanto lhe era possível, os revolucionários da Itália. Se ele mantinha uma guarnição na Cidade Eterna, é que a opinião católica da França não lhe permitia retirá-la, e o obrigava mesmo a conter um pouco o ímpeto da Casa de Sabóia. Assim, a revolução peninsular progredia quando o imperador dos franceses podia apoiá-la, ou então nos períodos em que conflitos com outros países forneciam a este um pretexto para cruzar os braços.
Uma das glórias da Igreja no século XIX foi a intransigência de Pio IX na defesa do poder temporal do Papa diante da investida do movimento revolucionário italiano e da ambição do Rei da Sardenha e Piemonte, que desejava reunir sob seu cetro todos os Estados da Península.
Os primeiros atentados contra os Estados da Igreja ocorreram em 1860, após a vitória da França sobre a Áustria no norte da Itália. A Santa Sé perdeu algumas províncias, ocupadas pelo Piemonte, e Pio IX, alarmado, resolveu reorganizar seu exército para defender os territórios que lhe restavam.
Ao ascender ao trono de São Pedro em 1846, Pio IX julgara poder aplacar a hidra revolucionária através da política do “ceder para não perder”, da qual em breve colheria abundantes e amargos frutos. Uma de suas primeiras medidas foi conceder uma anistia geral, que pôs em liberdade não pequeno número de conspiradores, adversários encarniçados da soberania temporal do Papa. Empreendeu depois várias reformas no governo de seus Estados, estabelecendo uma Câmara Legislativa, a exemplo das monarquias constitucionais, e acedeu em nomear ministros liberais.
A Revolução, longe de se contentar com isso, exigia sempre mais. Mazzini, um dos chefes da sociedade secreta “Jovem Itália”, chegou mesmo ao descaramento de propor ao Papa que se colocasse ele próprio à testa da revolução, assumindo o papel de paladino da unificação italiana. Assim, escreveu ele a Pio IX:
“Santíssimo Padre, eu estudo vossos passos com uma esperança imensa. Não receeis, confiai em nós. Nós fundaremos para Vós um governo único na Europa; conseguiremos transformar numa alavanca poderosa o instinto que abala de uma ponta a outra a terra italiana; nós e Vós ganharemos ativos auxiliares no meio de todos os povos do universo, e só nós, porque só nós possuímos a unidade do fim a que nos propomos e acreditamos na verdade de nossos princípios.
“Eu Vos escrevo porque Vos creio digno de ser iniciador desta grande empresa. Se eu estivesse a vosso lado, pediria a Deus que me desse o poder de Vos convencer com o gesto, a voz, as lágrimas” (Villefranche, p. 47).
Era o príncipe das trevas que falava pela boca do demagogo, renovando ao Vigário de Cristo as promessas que ao Divino Mestre fizera no alto de montanha: “Tudo Te darei, se prostrado me adorares”. A resposta só podia ser a mesma que Nosso Senhor deu ao tentador: “Retira-te, Satanás!” (Mt. 4,9). Com efeito, compreendendo enfim o erro de sua política de concessões, o Papa resolveu repelir as ofertas falaciosas da Revolução.
A reação dos carbonários não se fez esperar. Amotinaram o povo, cercaram o Palácio do Quirinal, residência do Papa, assassinaram seu primeiro-ministro, o Conde Rossi. Enquanto Pio IX buscava refúgio em Gaeta, no Reino de Nápoles, as hordas revolucionárias proclamavam a república em Roma e percorriam as ruas da Cidade Eterna espalhando o terror e saqueando igrejas e conventos. Uma nova intervenção franco-austríaca escorraçou os aventureiros Mazzini e Garibaldi, e o Papa pôde voltar à sua Capital.
“Italia fara da sè!”
“Italia fara da sè!” — exclamara Carlos Alberto quando a república francesa de Lamartine lhe oferecia auxílio para a anexação dos territórios austríacos da Península. A História se encarregaria de desmentir as palavras do Rei do Piemonte, transformadas em divisa dos revolucionários. A unificação italiana não se faria por si mesma. Sem o auxílio financeiro da Inglaterra vitoriana e o apoio militar do império de Napoleão III, a Casa de Sabóia jamais teria estendido seus domínios fora do Piemonte e da Sardenha.
Em 1859 um acordo entre Napoleão III e Vitório Emanuel garantia ao sucessor de Carlos Alberto todo o apoio em caso de conflito com a Áustria. Deflagrada a guerra, um exército francês de 116 mil homens entrou na Itália, e numa fulminante campanha de um mês os austríacos foram derrotados.
Em conseqüência dessa guerra, as tropas com que a Áustria protegia a Romanha tiveram que se retirar. A agitação, fomentada do exterior, tomou conta daquela província papal, bem como dos ducados da Toscana, Parma e Módena. Os revolucionários clamavam pela anexação desses territórios ao Piemonte. Quanto aos ducados, o imperador dos franceses não tinha objeções. Mas a Romanha pertencia ao Papa, e Luís Napoleão temia a reação dos católicos em seu país. A entrega da Sabóia e de um antigo país provençal, o Condado de Nice, bastou para aplacar-lhe os temores e fazê-lo permitir a anexação da Romanha. Afinal, era bem mais do que trinta moedas… Como compensação, a França prometia garantir a segurança do Papa em Roma, mantendo ali uma guarnição.
“À voz de Pio IX, não hesitei em retomar a espada”
“No debbo, non posso, non voglio!” — Não! Pio IX não se deixaria espoliar sem resistência. Estava disposto a defender a integridade dos seus territórios, ainda que pelas armas.
A impassividade com que as cortes européias assistiam aos atentados contra a sua soberania temporal mostrava ao Papa que ele só podia contar com os próprios recursos. O Cardeal Antonelli — hábil político, mas um tanto timorato — foi substituído à testa do Ministério pontifício das Armas por Monsenhor Xavier de Mérode, filho de uma família principesca belga de larga tradição militar, e ele mesmo soldado em sua juventude. Para assumir o comando efetivo das tropas e reorganizá-las, o novo Pró-Ministro das Armas foi buscar em seu castelo de Prozuel, na Picardia, o General Christophe de La Moricière, um bravo que lutara contra o Islã na África e se achava então no ostracismo, por não querer servir a Napoleão III.
O gentil-homem bretão atendeu prontamente ao apelo do Papa, e no dia 2 de abril de 1860 apresentava-se em Roma. No mesmo dia dirigiu aos oficiais, sub-oficiais e soldados pontifícios a seguinte ordem-do-dia:
“Soldados, Nosso Santo Padre o Papa Pio IX, tendo-se dignado chamar-me para defender seus direitos desprezados e ameaçados, não hesitei um instante em retomar a espada. Ao eco da venerável voz que há pouco, do alto do Vaticano, dava a conhecer ao mundo os perigos nos quais se encontra o Patrimônio de São Pedro, os católicos se comoveram e sua comoção estendeu-se rapidamente de um extremo a outro da terra. Todas as nações cristãs mostram neste momento que têm consciência dessas grandes verdades que constituem a nossa Fé. A Revolução, como outrora o islamismo, ameaça hoje a Europa; e hoje, como outrora, a causa do Papado é a causa da civilização e da liberdade do mundo. Soldados! tende confiança, e estai certos de que Deus sustentará vossa coragem e a elevará à altura da causa que Ele confiou à defesa de nossas armas” (Cerbelaud-Salagnac, “Les Zouaves Pontificaux” – Editions France-Empire, Paris. 1963, p. 18).
O estado em que La Moricière encontrou as tropas pontifícias era o mais lastimável. Constituíam-nas apenas onze batalhões com pouco mais de 6 mil homens, equipados com velhos fuzis, mal vestidos e desmoralizados; a cavalaria reduzia-se a um pelotão de dragões; a artilharia existia apenas nominalmente; os serviços de ambulância, de transportes e de material de acampamento simplesmente não existiam (Pougeois, vol. 5, p. 184).
Reorganizar — ou melhor, organizar o exército do Papa — não era fácil empresa. Enquanto a Inglaterra auxiliava o Piemonte, os garibaldinos, os mazzinianos e os revolucionários de toda espécie, a França recusava-se a fornecer qualquer armamento às tropas pontifícias, e oporia mais tarde obstáculos ao recrutamento de soldados para o Papa, não permitindo o embarque de voluntários nos portos do Mediterrâneo.
Para defender o que restava dos Estados da Igreja, estimava La Moricière que seriam precisos pelo menos 20 mil homens. Pio IX sabia como recrutá-los. A um apelo do Papa, afluíram voluntários de todo o mundo católico, jovens e homens feitos, de todas as classes sociais, mas sobretudo da aristocracia e da alta burguesia. Filhos das melhores famílias da França, Bélgica e Estados da Confederação Germânica envergaram o uniforme de simples soldados, para defender os direitos do Vigário de Cristo.
Cinco mil voluntários austríacos e três mil suíços formaram batalhões de carabineiros e completaram os efetivos dos regimentos de infantaria; oitocentos irlandeses constituíram uma unidade autônoma, o Batalhão de São Patrício; os recrutas de outras nacionalidades formaram os regimentos ditos “estrangeiros”. Quanto aos franceses e belgas, pretendia Monsenhor de Mérode reuni-los num corpo à parte.
O Batalhão de Atiradores Franco-Belgas.
Quando o Pró-Ministro das Armas foi anunciar ao Papa que o Barão de Charette estava em Roma e viera oferecer sua espada e seus serviços ao Chefe da Igreja, o Cardeal Antonelli, presente à entrevista, não se conteve: “Um tal ‘realista’! Não é possível! Seu nome é uma bandeira: será um desafio à guarnição francesa!” Pio IX deixou aflorar um sorriso e respondeu tranqüilamente: “Se ele é um verdadeiro ‘realista’, defenderá bem a minha realeza. Se é uma bandeira, saberá reunir muita gente em torno de si!”
Athanase de Charette de la Contrie, sobrinho-neto do grande Charette das guerras da Vendéia, por parte de mãe era neto do Duque de Berry e sobrinho do Conde de Chambord, pretendente legitimista ao trono francês sob o nome de Henrique V. Representava, pois, a mais genuína tradição contra-revolucionária. Tinha então 28 anos, e era capitão do exército austríaco, a serviço do Duque de Módena, recentemente deposto. Foi esse homem que Monsenhor de Mérode incumbiu de formar a companhia de franceses e belgas, cujo efetivo ainda não passava de quinze elementos. Esses quinze constituíram o embrião de um prestigioso corpo destinado a escrever uma das mais gloriosas páginas da história militar de todos os tempos.
Aos poucos os comitês de recrutamento criados na França e na Bélgica foram mandando novos voluntários. Ao cabo de um mês o efetivo dos atiradores franco-belgas somava já sessenta homens, e os comitês anunciavam para breve a chegada em massa de outros recrutas. Nesse ritmo, a companhia poderia dentro em pouco transformar-se em batalhão.
Considerando que o Capitão de Charette era ainda muito jovem para assumir o comando do futuro batalhão, la Moricière escolheu para a função um oficial superior com experiência de campanhas anteriores, o Conde Louis de Becdelièvre, o qual havia participado da expedição francesa que retomara Roma das hordas garibaldinas, ilustrara-se na guerra da Criméia, e agora viera colocar-se à disposição do Santo Padre. No dia 1º de junho de 1860, la Moricière entregou-lhe a patente de Major e o nomeou comandante do Batalhão de Atiradores Franco-Belgas.
Becdelièvre era um homem enérgico, e pôs logo em prática um intensivo programa de treinamento, instaurando ao mesmo tempo uma disciplina rígida, como ainda não se conhecia nos demais corpos pontifícios. Graças a isso, pôde apresentar sua tropa ao General de la Moricière já no dia 16 de junho. A unidade foi considerada apta a integrar definitivamente o exército pontifício, e no dia 18 recebia ordem de pôr-se em marcha, em missão de reconhecimento da região de Rieti, na Sabina.
“Vestir de muçulmanos os soldados do Papa”.
Depois dessa breve campanha, Becdelièvre julgou conveniente substituir o uniforme de seus homens, pois o que até então era usado prestava-se a confusão com os caçadores a pé do corpo francês de ocupação.
O Major propôs uma farda muito semelhante à de uma tropa colonial de elite do exército francês, que o General de la Moricière criara e comandara — os zuavos da África, assim chamados do nome da tribo indígena que lhes fornecera os primeiros soldados. Becdelièvre reputava esse uniforme ideal para infantes, por ser adequado às grandes caminhadas e deixar ampla liberdade de movimentos. Além de um quepe à francesa, cinza-azulado com aba quadrada vermelha, o fardamento proposto comportava jaqueta curta à moda turca, com guarnições e passamanaria vermelhas, colete cinza, larga faixa vermelha na cintura, “sarual” ou calça ampla e fofa, igualmente cinza, e polainas brancas. O uniforme dos oficiais era azul-claro, com guarnições, passamanaria e botas pretas. As divisas subiam em forma de oito sobre a manga, até o cotovelo.
Monsenhor de Mérode hesitava em consentir na adoção dessa farda, à qual se faziam algumas objeções: “Eis aí uma idéia bem francesa: vestir de muçulmanos os soldados do Papa!” — diziam alguns. O Conde de Becdelièvre não teve dúvidas. Mandou confeccionar um uniforme completo, e vestindo com ele o Sargento de Moncuit, apresentou-se ao Papa. Pio IX sorriu diante de tão singular vestimenta, mas, convencido de suas vantagens práticas, deu o seu consentimento. Em virtude da semelhança desse fardamento com o dos afamados zuavos da África, o público começou a chamar de zuavos os que ainda eram oficialmente atiradores franco-belgas.
Nove mil pontifícios contra 52 mil soldados piemonteses.
No dia 18 de agosto de 1860, tendo Garibaldi acabado a conquista da Sicília, cruzava o estreito de Messina e investia sobre Nápoles. Ao mesmo tempo, tropas regulares numerosas do Piemonte concentravam-se ameaçadoramente junto às fronteiras da Toscana e da Romanha. A invasão das Marcas e da Umbria parecia iminente. Em 8 de setembro chegou ao quartel-general dos exércitos pontifícios, estabelecido em Spoleto, a notícia da tomada de Nápoles pelos “camisas-vermelhas”.
Na manhã do dia 10, o general piemontês Fanti intimava la Moricière a evacuar as províncias cobiçadas pelo governo de Turim. O comandante pontifício respondeu que o rei do Piemonte e seu general poderiam ter-se dispensado de tal intimação: teria sido mais leal declarar a guerra desde logo. No dia seguinte, o IV e o V corpos de exército do Piemonte atravessavam a fronteira e ocupavam Urbino, Fossombrone e Città della Pieve, cujas portas foram-lhes franqueadas pelos revolucionários locais. As hostilidades estavam iniciadas. Sobre 9 mil soldados pontifícios, o Piemonte lançaria uma tropa de 52 mil homens.
La Moricière determinou a concentração de seus efetivos em Ancona, única praça em condições de resistir enquanto se aguardava socorro das potências católicas. Um apelo havia sido dirigido pela Santa Sé à França e à Áustria. Francisco José chegara a assinar a ordem para que suas divisões da Itália se pusessem em movimento, e para que a esquadra fundeada em Trieste cruzasse o Adriático a fim de levantar o bloqueio do porto de Ancona. Mas, por pressão de seus ministros, foi obrigado a revogar aquela ordem. O gabinete francês, por todas as garantias, mandava informar secretamente os piemonteses de que a Divisão do General Goyon, acantonada em Roma, não sairia de seus quartéis.
O comandante-em-chefe pontifício aguardava que suas tropas se reunissem em Loreto, para dali marchar sobre Ancona, quando começaram a chegar as primeiras notícias da retaguarda: o General Schimidt entregara quase sem resistência a cidade de Perugia, e o bravo Major irlandês O’Reilly tinha sido obrigado a render-se em Spoleto, não sem antes infligir severas perdas ao inimigo, num combate do qual participaram heroicamente vinte atiradores franco-belgas, que haviam ficado naquela cidade por estarem enfermos. Esse foi o primeiro feito de armas a inscrever-se no ativo da tropa comandada por Becdelièvre, à qual muitas glórias estavam reservadas. E para breve.
“Não o teria admirado mais vencedor, do que vencido”.
Os caminhos para Ancona, entretanto, estavam já bloqueados. Os piemonteses tinham ocupado o morro de Castelfidardo e estavam fortemente entrincheirados em duas propriedades rurais que dominavam o vau do Rio Musone, por onde os pontifícios teriam que passar forçosamente, para atingir a estrada de Ancona. Ao mesmo tempo, numerosa tropa espalhara-se pelas colinas adjacentes.
La Moricière decidiu forçar a passagem pela direita, e ordenou ao General Marquês de Pimodan que procurasse conquistar o morro de Castelfidardo e sustentar-se ali o tempo que fosse possível, enquanto ele tentaria, com a Brigada Cropt, atravessar o rio e atingir os franco-belgas, para constituírem a primeira vaga de assalto, juntamente com os carabineiros suíços e os dragões romanos do Major Príncipe Odescalchi.
Foi tal o ímpeto desse assalto, que a herdade mais próxima foi tomada. Os piemonteses retiraram-se para o alto do morro, de onde passaram a bombardear os soldados pontifícios. Depois de algum tempo suspenderam o canhoneio e voltaram à carga, mas foram valentemente repelidos. Pimodan ordenou então aos franco-belgas o assalto à segunda herdade: “Por secções, atrá de mim — comandou Becdelièvre — e que ninguém atire sem minha ordem!”
Tinham que atravessar uma campina, numa extensão de trezentos metros, sem o menor arbusto ou acidente de terreno que oferecesse abrigo. Os atiradores lançaram-se em vagas sucessivas, sem responder à intensa fuzilaria inimiga, e carregaram de baioneta calada sobre os piemonteses. Tentaram estes manter a posição, mas foram rudemente rechaçados até o alto da colina e debandaram pela outra encosta. Becdelièvre ordenou a seus homens que se entrincheirassem, para garantir a posição conquistada, mas uma avalanche de bersaglieri dez vezes mais numerosos lançou-se sobre eles, obrigando-os a recuar, no entanto disputando o terreno palmo-a-palmo. O General de Pimodan, que apesar de ferido no rosto por um tiro não quisera abandonar o comando, ao perceber o apuro dos franco-belgas enviou em seu auxílio uma companhia de caçadores latinos e duas de carabineiros suíços. Com esse reforço, o Major de Becdelièvre conseguiu recuperar a posição, que manteve durante três horas, repelindo sucessivos ataques do inimigo.
Entrementes, percebendo a manobra de la Moricière, o General piemontês Cialdini lançou oito batalhões sobre o flanco esquerdo da brigada do General Cropt, que tentava forçar a passagem para Ancona, e viu assim fechado o caminho. Durante algum tempo Cropt contra-atacou com vigor, chegando a levar vantagem sobre o inimigo. Mas subitamente o pânico apoderou-se de algumas unidades pontifícias, que começaram a debandar. Apesar dos esforços dos seus comandantes, não foi possível restabelecer a ordem. Traidores haviam-se infiltrado no exército do Papa, com o objetivo de criar a confusão.
Nesse momento o General de Pimodan tombava com uma bala no ventre. Quando o foram socorrer, exclamou: “Não é a mim que deveis vir, mas ao inimigo!” Becdelièvre tentou manter sua posição, mas a debandada da outra coluna não lhe permitia mais sustentar-se. Três quartos de seu batalhão jaziam sobre o solo, a começar pelos seus capitães, um dos quais morto e os outros três feridos. Charette, atingido no braço e na perna, só consentiu em se deixar transportar para a retaguarda depois do terceiro ferimento. Quando foi apresentada ao general piemontês Cugio a longa lista dos franceses mortos, ele exclamou: “Que grandes nomes! Dir-se-ia antes uma relação de convidados para um baile na corte de Luís XIV” (Pougeois, vol. 5, p. 227). O Coronel Guttenhoven, dos carabineiros austríacos, conduziu o que restava da coluna Pimodan para Loreto. Os inimigos logo puseram sítio à cidade, e os pontifícios foram obrigados a capitular.
Enquanto isso, de acordo com o plano que estabelecera, la Moricière chegava a Ancona sem ser perseguido pelo exército piemontês, que temia encontrar do outro lado do Rio Musone tropas de reserva tão aguerridas como as que tinha enfrentado durante aquela jornada. Apesar da derrota, o bravo general não se mostrava abatido. Tendo ouvido de seus lábios a narrativa do combate da manhã, o Conde de Quatrebarbes, comandante da praça de Ancona, escreveu:
“Escutei com profunda admiração esse relato, feito num tom muito calmo, sem uma palavra de amargura ou de cólera. Havia ao mesmo tempo em seus traços, em sua linguagem e em seu olhar a certeza do dever cumprido, a mais absoluta resignação à vontade de Deus e a abnegação de si mesmo até o sacrifício de sua própria glória, e eu não sei ainda hoje se o teria amado e admirado mais vencedor, do que vencido” (Cerbelaud-Salagnac, p. 51).
Desde 7 de setembro a esquadra do Almirante Persano castigava a cidade com um impiedoso bombardeio, destruindo casas e igrejas e fazendo grande número de vítimas entre a população civil. A fome e as doenças começavam já a produzir também a sua devastação. Como se não bastasse, Cialdini, depois de conseguir a capitulação de Loreto, sitiou Ancona por terra, com reforço das tropas que haviam invadido a Umbria.
Em vão la Moricière esperava os socorros pedidos: nenhuma vela austríaca surgia no horizonte, e Goyon permanecia em seus quartéis de Roma.
No dia 26, após sofrer violento canhoneio, o pilar de sustentação da grossa corrente que fechava a entrada do porto de Ancona tombou, rasgando uma brecha de 500 metros, larga porta aberta às companhias de desembarque da armada piemontesa. La Moricière compreendeu que não podia mais resistir. Fazendo içar a bandeira branca, enviou um emissário ao comandante inimigo com o oferecimento de uma capitulação honrosa. As condições impostas pelo general pontifício foram aceitas e a praça se entregou.
As Marcas, a Umbria e a Romanha estavam definitivamente perdidas para o Papa.
Nasce o Batalhão de Zuavos Pontifícios.
Os revolucionários fizeram logo realizar plebiscitos nos novos territórios arrancados ao Pontífice e ao Rei de Nápoles, para saber se as populações queriam ou não a sua incorporação ao Piemonte. Não é preciso dizer que as votações, adrede “preparadas”, deram o resultado desejado.
Restava a Pio IX apenas o Lácio, cobiçado também pela insaciável Casa de Sabóia, e que era preciso defender.
Castelfidardo emocionara a Europa. Novos recrutas afluíram em quantidade, para servir sob as bandeiras da Igreja. Infelizmente o comitê belga de recrutamento não era muito rigoroso, e admitia entre os atiradores franco-belgas antigos soldados, bravos talvez, mas indisciplinados. Considerando que o espírito mesmo de sua unidade estava ameaçado, muitos franceses falavam em retirar-se. Depois de uma entrevista com Becdelièvre, promovido agora a tenente-coronel, o Pró-Ministro das Armas decidiu licenciar o Batalhão de Atiradores Franco-Belgas, ao mesmo tempo que encarregava o Conde Louis de Becdelièvre de construir um novo corpo, denominado agora oficialmente de Zuavos Pontifícios, com o que ficava consagrado o nome criado pelo povo.
O efetivo foi ampliado e o recrutamento aberto a todas as nacionalidades. Em torno de um sólido núcleo franco-belga, cuidadosamente selecionado, foram incorporados os remanescentes irlandeses do Batalhão de São Patrício, ingleses, escoceses, suíços, latinos, italianos dos Estados e províncias usurpadas pela Casa de Sabóia, austríacos, alemães, espanhóis.
No dia 9 de janeiro de 1861 o novo capelão, Padre Jules Daniel, bretão de Nantes como Charette, recebia dos zuavos reunidos na Praça São João de Latrão o juramento de fidelidade ao Papa. Todos em conjunto — os oficiais com a espada erguida, e os soldados com a mão direita levantada e a esquerda apresentando armas — repetiram após os chefes de corpo, frase por frase: “Juro a Deus Todo-Poderoso ser obediente e fiel a meu Soberano o Pontífice Romano, Nosso Santíssimo Padre Pio IX, e aos legítimos Sucessores. Juro servi-lo com honra e fidelidade, e sacrificar minha vida pela defesa de sua pessoa augusta e sagrada, pela defesa de sua soberania e de seus direitos. Juro não inscrever-me em nenhuma seita ou sociedade secreta condenada pelos decretos dos Pontífices Romanos” (Cerbelaud-Salagnac, p. 64).
De volta à caserna, o batalhão logo recebeu ordem de se deslocar para Nerola e entrar na província de Rieti, para ali restabelecer o governo pontifício, atendendo assim ao clamor das populações. A tropa deveria evitar encontro com forças superiores em número, e retirar-se caso isso se desse.
Os zuavos põem-se a caminho de Nerola, e os piemonteses recuam, ao saber de sua aproximação. O batalhão avança para Monte-Libretti, Monte-Rotondo, e com um golpe de audácia apodera-se de Ponte-Correze. Estavam os zuavos prestes a entrar em Rieti, quando um estafeta chega com uma intimação do General Goyon: não deviam ir mais longe, sob pena de conflito com os franceses. Perplexo, Becdelièvre decide esperar instruções de Roma. Pouco depois um oficial de estado-maior pontifício traz ordem da parte de Monsenhor de Mérode, no sentido de se atender a exigência do comandante francês. A decepção é geral entre os zuavos, mas o Pró-Ministro havia atingido seu objetivo: obrigar Goyon a proteger a fronteira com a Umbria.
Salvo algumas escaramuças com hordas garibaldinas, os zuavos permaneceram durante muito tempo inativos, pois Monsenhor de Mérode preferia fazer com que as tropas do General Goyon atuassem. Essa situação desagradou imensamente o Coronel de Becdelièvre, como aliás a todo o batalhão. Eram eles voluntários e tinham ido para Roma a fim de lutar pelo Papa, e não para ficar andando de um lugar para outro, sem poder travar batalha. A esse propósito houve um desentendimento entre o Ministro das Armas e o comandante dos zuavos, que foi demitido. Solidários com Becdelièvre, demitiram-se sete oficiais sob seu comando, todos veteranos de Castelfidardo. Essa grave crise só não foi fatal para o batalhão graças à habilidade e firmeza do Capitão de Charette e do Capitão d’Albiousse, nomeado comandante interino. A rigor, o comando interino deveria caber a Charette, o mais antigo dos capitães e o primeiro oficial do batalhão, mas houve receio de descontentar Napoleão III, dando destaque a um legitimista tão notório, sobrinho do Conde de Chambord.
Afinal o comando efetivo foi confiado ao coronel suíço Allet. O Barão de Charette, promovido a Major, viu-se nomeado subcomandante. Um alto personagem interpelou a respeito o Ministro, afirmando que este estava dando uma bandeira branca (a bandeira do legitimismo francês) aos zuavos. Monsenhor de Mérode teria respondido: “Essa bandeira foi perfurada pelas balas em Castelfidardo. É justo que seja colocada junto do túmulo de São Pedro” (Cerbelaud-Salagnac, p. 75).
O novo comandante, Tenente-Coronel Allet, pertencia a uma dessas famílias suíças nas quais se era soldado de pai a filho, “a serviço estrangeiro”. Servia dedicadamente o Papa havia trinta anos. À testa de um regimento, Allet havia-se portado valentemente em Castelfidardo, merecendo um elogio de la Moricière. A difícil escolha de um substituto para Becdelièvre não podia ter sido mais feliz.
Seguiram-se para os zuavos longos meses de inação, na monótona vida de caserna. Mas eles se lembravam do conselho que lhes havia dirigido Becdelièvre ao despedir-se do batalhão: “Não vos esqueçais daquilo que vos tenho dito sem cessar: a primeira virtude do verdadeiro soldado é a resignação, e a verdadeira coragem se mostra mais nas provações de cada dia da vida militar do que no campo de batalha” (Cerbelaud-Salagnac, p. 75).
Nesse tempo aconteceu um fato que naturalmente causou profunda impressão entre os zuavos. Um jovem oficial, o Tenente Garoni, que recebera um grave ferimento em Castelfidardo, não tinha sarado, e seu estado piorou de repente, colocando-o às portas da morte. Um irmão seu, que era padre, foi visitá-lo e lhe disse: “Por que não te recomendas a Joseph Guérin, teu antigo camarada de armas, que morreu piedosamente em conseqüência dos ferimentos recebidos em Castelfidardo? Muitas graças extraordinárias já têm sido obtidas, tanto na Bretanha, sua terra natal, como em Roma mesmo”. O moribundo aquiesceu com um olhar e desfaleceu. A freira que o assistia julgou que ele houvesse expirado, mas três quartos de hora depois Garoni abriu os olhos e disse à religiosa: “Não é preciso dar-me mais nenhum remédio. Guérin, o zuavo, apareceu-me, sentou-se no meu leito e prometeu-me que eu sararia, mas que teria uma longa convalescença”. Tudo se passou assim (Cerbelaud-Salagnac, pp. 78-79). Outros milagres foram atribuídos a Guérin, que passou a ser invocado pelos zuavos como especial protetor.
“Um tal desprezo da morte excede as forças da natureza”.
No dia 3 de maio de 1862 — festa da Exaltação da Santa Cruz — deu-se a emocionante cerimônia da entrega das bandeiras aos diversos corpos do exército pontifício. Pio IX, revestido de murça vermelha guarnecida de arminho, e de estola, rodeado de toda a sua corte — cardeais, prelados, guardas-nobres, gentis-homens — benzia as bandeiras apresentadas pelos capelães das unidades e as entregava aos comandantes. A voz do Pontífice-Rei soava grave e forte: “Accipe vexillum caelesti benedictione sanctificatum, sitque inimicis populi christiani terribile, et det tibi Dominus gratiam ut ad Ipsius nomem et honorem cum illo hostium cuneos potenter penetres incolumis et securus” (id., p. 81).
Em julho, receberam os zuavos ordem de partir para Ceprano, no extremo sul dos Estados do Papa. Um certo Chiavone, à testa de um formidável bando de guerrilheiros napolitanos, vivia hostilizando as tropas piemontesas que ocupavam o Reino de Nápoles, e temia-se que estas últimas, a pretexto de o perseguir, violassem o território pontifício.
No dia 30, os “chiavonistas” se batem com os piemonteses e os obrigam a passar a fronteira do Lácio. O Coronel Allet envia para o local uma seção de reconhecimento, que se defronta com duzentos bersaglieri, e põe por terra 32 deles na primeira salva. Os demais recuam, desnorteados, mas do outro lado da fronteira os napolitanos os aguardam e abatem como caça.
O General francês Goyon, ao ter conhecimento do incidente, envia às pressas duas companhias imperiais para substituir os zuavos, que retornam a Marino, onde se achavam acantonados. No fim desse ano o batalhão é transferido para Frascati, e ali entra novamente na monotonia da vida de guarnição.
Viria tirá-los dessa monotonia dois anos depois, em 1864, a famosa “Convenção de Setembro”, celebrada entre Napoleão III e Vitório Emanuel, à inteira revelia do Papa. Em 1861, o Rei da Sardenha e do Piemonte havia assumido o título de “Rei da Itália”, o que não deixava margem a dúvidas quanto às suas pretensões sobre os territórios remanescentes do Papa e sobre o Vêneto austríaco. Para facilitar a realização dessas pretensões, as tropas francesas deveriam deixar os Estados Pontifícios no prazo de dois anos. Desde logo evacuaram elas a província de Veletri e foram substituídas pelos zuavos, distribuídos por várias guarnições.
Uma nova fase na vida do batalhão de zuavos começa aqui: a da repressão ao banditismo.
A luta contra o banditismo, valioso adestramento.
O banditismo no sul da Itália era um fenômeno sui generis. Não se limitava, como em outros países, a ações de indivíduos isolados ou de pequenos grupos, mas comportava operações de larga envergadura, empreendidas por bandos de dezenas e até centenas de homens fortemente armados, com uma organização quase militar. Durante séculos esse foi um grave problema para os soberanos de Nápoles e para os Papas. As épocas de agitação revolucionária favoreciam enormemente a atuação dos bandoleiros, pela desagregação das instituições e o abalo da autoridade. Foi o que se deu por ocasião da invasão napoleônica, e agora com a dupla agressão do Piemonte e das tropas irregulares de Garibaldi.
A repressão ao banditismo era dificultada pela carência de apoio da população, a qual, por simpatia ou por temor, dava aos fora-da-lei ampla cobertura. Todos sabiam onde eram seus esconderijos, quem lhes fornecia mantimentos, munições, etc. Mas recusavam-se peremptoriamente a dar qualquer informação às autoridades. Por vezes, estas também eram cúmplices. Em San Stefano, por exemplo, onde aparecia com freqüência um dos mais terríveis chefes de bandoleiros, Andreozi, realizou-se certa feita uma grande festa, à qual compareceram, além do bandido e grande número de seus sequazes, o prefeito da cidade e dois cônegos.
Tão logo os zuavos substituíram em Veletri as tropas chamadas de volta à França por Napoleão III, começaram os choques entre eles e os bandoleiros. Alguns desses choques constituíram verdadeiras batalhas, nas quais as forças dos malfeitores chegavam a contar com até duzentos homens. Essas operações foram de grande proveito para os zuavos, servindo-lhes de excelente preparação para a dura campanha de 1867.
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