A força do amor materno

A força do amor materno
Edwarda O'Bara e sua mãe Kathryn
A força do amor materno
Edwarda O’Bara e sua mãe Kathryn

Até onde vai a força do amor materno? Diz a Escritura que “o amor é forte como a morte” (Ct. 8,6) . Talvez se possa dizer que o amor de uma verdadeira mãe ultrapassa tal força.

Disso nos dá exemplo a dolorosa saga da norte-americana Edwarda O’Bara, transmitida pelo site católico espanhol Religion en Libertad.

Edwarda morreu na véspera do Dia de Ação de Graças do ano de 2012, após passar 42 anos em coma por causa de um choque diabético. Era considerada a pessoa a passar mais tempo nessa situação.

Como conta a reportagem de Wayne Drash para a CNN, no dia 21 de novembro [de 2012] sua irmã Colleen deu-lhe banho, penteou-a e a intubou para alimentá-la como fizera já milhares de vezes antes. Depois, deu-lhe um beijo e disse que ia preparar café.

“Dedicou-me o maior sorriso que me tinha oferecido em toda sua vida. Seu rosto resplandecia e seus olhos brilhavam”. Então, cerrou-os para sempre. Tinha 59 anos.

Presentes do Bom Deus

Edwarda nascera em 1953, no seio de uma família formada em 1948. Seu pai era Joe O’Bara, campeão de peso médio da Marinha durante a Segunda Guerra Mundial e jovem estrela da equipe de futebol americano da Universidade de Pittsburgh. Sua mãe, Kathryn McCloskey, filha do prefeito de Johnstown (Penssylvania).

“Tudo o que eu queria na vida era ter duas filhas. Deus foi bom comigo, e concedeu-me meu desejo”, dizia Kathryn. Quando se instalaram na Flórida, Joe começou a dar classes de ginástica em um colégio, e Kathryn de matemática no instituto.

Amor materno, amor fraterno

Edwarda foi a primeira a nascer, antes de Colleen. Eram muito diferentes. A mais velha, tranquila e prudente. A menor, um terremoto e amante de emoções fortes.

Ambas tinham cavalos, porém a divisão de tarefas diz tudo sobre o caráter de cada uma. “Ela limpava os estábulos e escovava os animais, e deixava-me toda a diversão”, recorda Colleen.

“Era doce e carinhosa”, continua, “a irmã mais generosa que se podia sonhar, e minha melhor amiga”.

Em fins de 1969, Edwarda foi diagnosticada com diabetes. Isso não lhe impediu de continuar as aulas, e queria estudar pediatria.

Entretanto, no Natal daquele ano caiu doente de gripe, e uma complicação com a insulina que lhe fora prescrita provocou uma forte reação. No dia 3 de janeiro de 1970, seu pai a encontrou em seu quarto em plena crise, com as pernas cheias de nódulos.

A promessa: “Nunca te deixarei”

Levaram-na imediatamente ao hospital, e o Doutor Louis Chaykin, que estava de plantão, recorda ainda as palavras que Edwarda disse a sua mãe: “Por favor, mamãe, nunca me deixe!”. “Nunca te deixarei”, foi a resposta de Kathryn.

Pouco tempo depois, falharam os pulmões da menina, os rins, o coração… e o oxigênio deixava de chegar ao cérebro.

“Trabalhamos com ela durante horas”, evoca o médico, que tinha então 35 anos: “Conseguimos reverter muitas anormalidades metabólicas, mas o dano no cérebro era permanente. Estava em estado de coma”.

Podiam tê-la levado a uma casa de cuidados, e a Seguridade Social teria arcado com os gastos: “Contudo, mamãe tinha-lhe feito uma promessa, e para meus pais, quando você promete algo a alguém, deve cumpri-lo”, disse Colleen.

Assumiram então os custos, e Edwarda, depois de alguns meses no hospital, foi viver em casa.

Um lar transformado

Os O’Bara reformaram seu lar para manter os cuidados com a filha de manhã até a noite, com alimentação em intervalos de duas horas. O que incluía as doze, duas, quatro e seis horas da madrugada, sempre a partir do alarme do relógio.

O Doutor Chaykin quis ajudar e se ofereceu gratuitamente: “Sabendo o que custava mantê-la, jamais teria aceito dinheiro”.

As exigências do cuidado de Edwarda passaram a conta a seus pais. Kathryn começou a padecer de artrite pelos esforços físicos que realizava. Em 1982, sofreu um infarto e esteve dez dias hospitalizada. Era a primeira vez que se separava de Edwarda desde o choque diabético que a tinha levado ao coma.

Joe, que assumira três empregos para poder pagar os cuidados com sua filha (desde pintor até mecânico de motores náuticos), tinha falecido em 1976. Foi de certo modo vítima do estresse, porém feliz por ter tido sua filha em casa durante todo o tempo.

Milagres?

Durante os anos seguintes, o caso dos O’Bara foi adquirindo notoriedade.

Personalidades como o presidente Bill Clinton, Jed Bush (governador da Flórida) ou o contaor Neil Diamond visitaram Edwarda em sua casa.

Kathryn escreveu a João Paulo II e recebeu uma resposta de próprio punho do papa.

Wayne Dier, célebre autor de livros de autoajuda, escreveu um livro (Promessa é promessa) sobre o amor incondicional de Kathryn por Edwarda.

E como se espalhou a notícia de que em torno daquela mulher em coma aconteciam milagres, e era conhecida a devoção mariana de Kathryn, muitas pessoas cruzaram o planeta para tocá-la.

O Doutor Chaykin não afirma nem nega, mas diz que algumas das coisas que viu não admitem explicação médica.

Três tiros contra Edwarda e sua mãe

Entretanto, nem tudo foram consolos.

Grupos partidários da eutanásia telefonaram em 1981 ao domicílio dos O’Bara para instar-lhes a deixar Edwarda morrer.

Em 26 de dezembro daquele ano, um desconhecido ameaçou tirar-lhe ele mesmo de “sua miséria”. Horas depois, a casa era alvejada, embora ninguém tenha saído ferido com os três impactos de bala recebidos.

O próprio Chaykin chegou a duvidar, sobretudo por causa da morte de Joe e da difícil situação em que ficara a família, se teria feito bem em conservá-la viva.

Contudo, logo foi mudando de opinião:

“Fiquei impressionado pela dedicação de pelo amor de sua mãe. Com o passar dos anos, pensei que talvez Deus tinha uma razão desconhecida para que Edwarda sobrevivesse, mesmo que em coma”.

O prêmio por cuidar de Edwarda

A sensação de “paz e amor” que se percebia na casa era consolo suficiente para as pessoas que, desde o Japão ou da Austrália, vinham ver Edwarda e rezar junto com Kathryn.

Porque, para esta, cuidar de sua filha era “uma bênção de Deus”, mais do que o milagre da cura de sua filha.

A mãe sempre esperou no milagre, como recorda o periodista Charles Whited, do Miami Herald, que escreveu sobre o caso, e a quem a mãe dirigia cartas de vez em quando.

“Talvez em breve Edwarda não supere outra infecção”, disse-lhe em uma delas, “mas ainda assim me sentirei feliz por ter podido cuidar dela e por todo o amor que as pessoas lhe têm demonstrado”. Isso se deu em 1982.

As duas palavras de Edwarda

Em agosto de 1983, Kathryn escutou uma pequena palavra de sua filha: “Ei!”. A mãe estava com uns amigos na cozinha e todos se precipitaram para o quarto, onde encontraram Edwarda sorrindo.

No dia seguinte, voltou a fazê-lo. Nunca mais, porém, nos 21 anos seguintes, embora essa singela expressão tenha alimentado a ilusão da família durante todo esse tempo.

“Agora, nada mais me pode derrotar. Edwarda falou. Falou realmente”, confessava sua mãe.

A mensagem da família O’Bara

Durante os 38 anos em que assistiu a filha, Kathryn sempre disfrutou das visitas feitas a sua filha.

“Aquele nunca era um lugar triste”, recorda uma das pessoas que o frequentavam. “A gente sempre ia embora com a consciência das prioridades na vida, e de quão importante é a família”.

Kathryn reconhece:

“Deus me deu forças para cuidar de Edwarda enviando-me anjos de todo tipo: familiares, amigos, estranhos que acabavam se tornando amigos… Deus me deu o presente de manter a alegria e ser capar de ajudar os outros”.

O drama de Edwarda consertou o de Colleen

A mãe de Edwarda morreu em março de 2008, aos 80 anos de idade, depois de 38 anos inteiros, dia após dia, hora após hora, consagrados a sua filha. Encontraram-na no chão do quarto.

Sempre tinha duvidado do que faria Colleen nesse caso, porque sabia que a irmã mais nova não tinha chegado a compreender as razões dessa desgraça, à que se juntou a morte de seu pai quando tinha 21 anos.

“Era meu confidente, meu recurso quando minha mãe estava atarefada com Edwarda”, recordava a irmã, referindo-se ao pai.

Colleen casou-se em 1974 e teve um filho em 1976, mas em 1980 se divorciou. Então se mudou, com seu filho, para a casa da mãe.

Colleen meteu-se no mundo das drogas, chegando a ser sentenciada a nove meses de prisão no início dos anos 90. Foi providencial.

“Compreendi que se algo acontecesse com minha mãe estando eu atrás das grades, ninguém cuidaria de Edwarda. A prisão mudou minha vida. Compreendi qual era meu lugar”, recorda agora Colleen.

Assim, procurou trabalho próximo à casa familiar e começou a ajudar a Kathryn nos cuidados. Quando a mãe morreu, estava já bem preparada.

Embora padeça esclerose múltipla, deixou seu trabalho e conseguiu atender a Edwarda: “Minha mãe se perguntava se eu seria capaz. Mas quando você ama alguém, você consegue. É o que se faz pela própria família”.

E consagrou a Edwarda, também dia após dia, hora após hora, cinco anos até sua morte.

A despedida da Virgem

“Eu sabia que gostava de minha irmã. Porém, até o momento em que nos deixou fisicamente, não compreendia o quanto me ia doer. Sinto um vazio em meu coração”, diz a irmã mais nova.

Em 28 de novembro de 2012, Edwarda foi sepultada junto a Kathryn e a Joe.

Voltando do funeral, Colleen entrou no quarto, dolorosamente vazio, que sua irmã mais velha tinha ocupado durante 42 anos, a doce e carinhosa menina que cuidava dos estábulos para que ela apenas se preocupasse de montar a cavalo.

“Na tela da televisão – recorda – pude ver durante alguns segundos uma imagem da Virgem Maria”. A companheira invisível de Edwarda e de sua mãe as tinha reunido por fim junto a si no seio dos justos.

Seja o primeiro a comentar

Deixe um comentário