Qual a doutrina católica sobre o Matrimônio?
O mundo moderno está cheio de famílias e casamentos destruídos. Infelizmente, nessa estatística incluem-se muitos católicos.
Ao invés de oporem-se à decadência da instituição familiar, muitos a favorecem, aceitando a facilitação do divórcio e os arranjos de ‘união estável’. Como resultado, tais concessões vêm se tornando ‘normais’, até um ‘lugar comum’.
A confusão reinante na sociedade civil se estendeu até para a Igreja. A própria essência do casamento e da família entrou agora em questão. Diante disso, não podemos nos esquecer das palavras de Nosso Senhor: “Aquilo que Deus uniu, que o homem não separe” (Mc. 10,9).
Não se trata de palavras vazias. Além da autoridade divina que as sustenta, elas têm a seu lado a lógica e a própria natureza. Estas provam claramente que o casamento deve ser permanente e indissolúvel.
Entender a verdade perene sobre o casamento é o primeiro – e mais importante – passo para ajudar a sociedade a retomar os trilhos neste assunto crucial.
São Tomás de Aquino é a autoridade mais qualificada para explicar tais verdades. Oitocentos anos já se passaram desde que ele as expôs. Ainda assim, sua explanação está ainda tão fresca como se tivesse sido feita ontem! Ela trata dos problemas atuais relacionados ao matrimônio e à família.
O casamento é uma instituição natural
A palavra ‘natural’ é susceptível de duplo sentido.
Num, é natural o necessariamente causado por princípios naturais e assim, mover-se para o alto é natural do fogo. Ora, neste sentido o matrimônio não é natural, como natural não é o que resulte da mediação ou da noção do livre arbítrio.
Noutro sentido, chamamos natural aquilo a que a natureza inclina, mas que se realiza como um ato livre; assim se chamam naturais os atos das virtudes. Ora, neste sentido o matrimônio é natural, porque a razão natural duplamente nos inclina para ele.
(Suma Teológica, Suplemento, Q.41. A1)
Comentário: Àqueles que argumentam que a natureza permanente do vínculo matrimonial é uma invenção humana, S. Tomás refuta dizendo que tal vínculo é, de fato, uma união natural.
O Matrimônio, diz ele, é natural não por si mesmo, mas no sentido de que qualquer homem que comece uma família naturalmente deseja e procura uma união permanente entre ele e sua esposa.
As finalidades do matrimônio
Fim primário
S. Tomás:
[O] fim principal [do matrimônio] é o bem da prole. Pois a natureza não visa só a geração dos filhos, mas a criação deles e a sua educação até o estado de homem perfeito, como tal, que é o estado de homem virtuoso.
Donde, […] os três benefícios que dos nossos pais recebemos: a existência, a nutrição e a disciplina. (Ibid.)
Comentário: contrariamente ao moderno conceito de casamento, que afirma ser o amor entre os esposos o aspecto essencial, o verdadeiro fim central é a procriação e a educação dos filhos.
A união matrimonial visa antes de tudo a fornecer novos membros à Igreja e a prepará-los para a união com Deus no céu.
As palavras de Nosso Senhor desde o Gênesis, “crescei e multiplicai-vos” (Gen. 1,28), não foram sem propósito. Tudo aquilo que destrói, manipula ou deliberadamente desvia a finalidade do matrimônio é contrário às leis divina e natural.
Entre outras coisas, o “casamento” homossexual se volta contra o casamento verdadeiro, pois, sendo tais uniões intrinsecamente estéreis, sua justificativa reside meramente num apego emocional antinatural a um indivíduo baseado apenas no prazer carnal.
Fim secundário
S. Tomás:
[O] fim secundário do matrimônio é o obséquio mútuo que os cônjuges mutuamente se dispensam, na vida doméstica.
Pois, assim como a razão natural dita, que os homens vivam em sociedade, […] assim também das atividades necessárias à vida humana, umas competem ao homem e outras, à mulher.
Por isso a natureza induz a uma associação entre o homem e a mulher; e nisso consiste o matrimônio. (Ibid.)
Comentário: eis a segunda finalidade do matrimônio, o apoio mútuo entre os esposos. E não se trata meramente da ligação emocional que os esposos têm entre si.
Entre diversos fatores importantes, o casamento necessita de estabilidade financeira, capacidades físicas para o trabalho, um ambiente propício para a vida de família e, sobretudo, virtude sólida.
Viver e trabalhar sempre juntos necessariamente acarreta pequenos aborrecimentos, que podem culminar em grande sofrimento, tornando a vida por vezes insuportável.
Por isso, a caridade e a paciência precisam sempre estar presentes, para que ambos possam cooperar na vida em conjunto, garantindo que as necessidades da família sejam providas.
A permanência do Matrimônio
Indissolúvel por natureza
O matrimônio, na intenção da natureza, se ordena à criação dos filhos, não só temporariamente, mas por toda a vida deles.
Por isso é de lei natural que os pais entesourem para os filhos e estes sejam herdeiros daqueles (2Cor. 12,14).
Logo, sendo os filhos o bem comum do marido e da mulher, deve a sociedade conjugal ficar perpetuamente indissolúvel, segundo o ditame da lei natural. Assim que a indissolubilidade do casamento é de lei natural.
(Suma Teológica, Suplemento, Q.67 A.1)
Comentário: o matrimônio é fundado em sua finalidade primária, de onde decorre naturalmente uma união inseparável. Tal permanência traz consigo o feliz resultado de uma família estável.
Um auxílio a mais para a Finalidade primária do Matrimônio
S. Tomás:
“O filho sem pais determinados e certos não poderia ser por eles educado e instruído. E essa certeza não existiria sem a obrigação de unir-se um homem a uma mulher determinada, sendo isso o que constitui o matrimônio”.
(Suma Teológica, Suplemento, Q.41 A.1)
Comentário: a indissolubilidade é consequência natural do fim primário. É também forte garantia da sensação de estabilidade na vida da criança, dando-lhe identidade, suporte, cuidado e iniciativa.
Todos esses benefícios preparam o caminho para formar um fiel católico, ao mesmo tempo que um cidadão ordenado e produtivo.
Indissolubilidade como reflexo de Cristo e de Sua Igreja
S. Tomás:
“A indissolubilidade é natural ao matrimônio, como símbolo da perpétua conjunção entre Cristo e a Igreja, e como exigido pela sua função natural, ordenada ao bem da prole, como se disse. […]
A indissolubilidade do matrimônio se entende antes, como para o bem do sacramento que para o da prole. Embora possa estar compreendido tanto num como noutro bem.
Ora, enquanto pertencente ao bem da prole, será a indissolubilidade de lei natural; mas não enquanto pertinente ao bem do sacramento”.
(Suma Teológica, Suplemento, Q.67 A.1)
Comentário: aqui São Tomás responde àqueles que objetariam a permanência do casamento após o amadurecimento dos filhos e o fato de deixarem a casa paterna.
Nesta linda réplica, ele mostra que marido e mulher devem refletir a eterna união entre Cristo e Sua Igreja (cf. Ef. 5,22-23), ligados por uma fidelidade inquebrantável.
O matrimônio é monogâmico
Para a criação dos filhos e o mútuo apoio entre os esposos
S. Tomás:
“[A] pluralidade de mulheres, nem exclui totalmente, nem de certo modo impede o fim primário do matrimônio [procriação e educação da prole].
Mas o fim secundário, embora não o exclua totalmente, contudo grandemente o impede, porque não pode haver paz numa família em que um homem está unido a várias mulheres.
Pois, além de não poder um só homem satisfazer aos desejos de várias mulheres, a participação de vários no desempenho de uma mesma função causa disputas”.
(Suma Teológica, Suplemento, Q.65 A.1)
Comentário: São Tomás observa que a criação dos filhos, e talvez até mesmo o sustento de mais de uma esposa, seja fisicamente possível.
Entretanto, ele aponta que isso é inteiramente contra-intuitivo, já que os sofrimentos que acompanham o casamento serão intensificados pela presença de vários indivíduos competindo por favores. Essa não seria a paz desejada por Cristo para uma família católica.
Embora S. Tomás não o diga diretamente, pode-se facilmente inferir que a discórdia que permeia uma “família” poligâmica destruiria os padrões morais da criança, bem como seu desenvolvimento psicológico. Assim, ao menos indiretamente, a poligamia é contrária à devida criação da prole (isto é, o fim primário do casamento).
Reiteração da Fidelidade de Cristo a Sua Igreja
S. Tomás:
“[O matrimônio] tem além disso um fim ulterior, quando contratado entre cristãos, que é simbolizar a união entre Cristo e a Igreja. […] Assim como Cristo é um só, assim também uma só é a Igreja”. (Ibid.)
Comentário: se as razões de oposição à poligamia parecessem de índole secundária, aqui S. Tomás mostra como ela contraria a intenção de Nosso Senhor ao criar o casamento, qual seja, de espelhar Sua fidelidade à Igreja. É isto, sobre tudo o mais, que faz da poligamia um grave mal e uma ofensa a Deus.
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